terça-feira, maio 23

A Dream Within a Dream


Take this kiss upon the brow!
And, in parting from you now,
Thus much let me avow-
You are not wrong, who deem
That my days have been a dream;
Yet, if Hope has flown away
In a night, or in a day,
In a vision, or in none,
Is it, therefore, the less gone?
All that we see or seem
Is but a dream within a dream.

I stand amid the roar
Of a surf-tormented shore,
And I hold within my hand
Grains of golden sand-
How few! yet how they creep
Through my fingers to the deep,
While I weep - while I weep!
Oh God! can I not grasp
Them with a tighter clasp?
Oh God! can I not save
One from the pitiless wave?
Is all that we see or seem
But a dream within a dream?

Edgar Allan Poe (1809-1849)

segunda-feira, maio 15

Poema sem título...

Obrigada prima, por me teres deixado publicar isto aqui n’A Caixa!

Hoje no autocarro
Senti uma coisa estranha nas minhas costas.
Ao olhar para trás, no entanto, nada vi
Será que era a mão fria da morte?
E se eu fosse avisado que ia morrer hoje?
Entraria em pânico?
Ficaria aliviado?
Pensaria em todas as coisas que fiz?
Por outro lado, pensaria em todas as coisas que não fiz?
E se pensasse?
Se pensasse nas férias que não fiz por falta de dinheiro?
Ou do dinheiro que juntei a pensar numas férias que não chegariam?
E se pensasse nas coisas que sempre quis fazer mas que com medo do futuro não fiz?
Comer bolos,
Fazer amor sem preservativo,
Não fazer aquele exame chato,
Guiar um carro sem ter a carta de condução,
Atirar-me de um avião.
Não, isto por acaso nunca quis fazer
Mas hoje, depois de sentir aquele frio gelado, deu-me para isso.
E já que vou morrer porque não fazê-lo?
E faço-o.
E morro.
O pára-quedas não abriu, morri.
E se a minha morte fosse provocada por esta vontade louca de viver a vida que me restava?
De viver o meu último dia.
Ainda estaria vivo.
Ainda sentiria na minha mão a caneta que escreve estes versos.
Ainda estaria a fazer sentido. Porque afinal, a morte não o tem muito, ao sentido.
Aparece quando aparecer.
Não me vou atirar de um avião.
Não vou guiar sem carta,
Não vou fazer amor sem preservativo,
Não vou comer bolos.
E não vou sentir a mão fria nas minhas costas.


Catarina Poderoso

terça-feira, maio 9

Uns

Em jeito de homenagem ao nosso trabalho de Estudos Pessoanos que apresentámos ontem...
Uns, com os olhos postos no passado,
Vêem o que não vêem: outros, fitos Os mesmos olhos no futuro, vêem
O que não pode ver-se.

Por que tão longe ir pôr o que está perto —
A segurança nossa? Este é o dia, Esta é a hora, este o momento, isto
É quem somos, e é tudo.

Perene flui a interminável hora
Que nos confessa nulos. No mesmo hausto Em que vivemos, morreremos. Colhe o dia, porque és ele.
Ricardo Reis

quinta-feira, maio 4

Teatro da Boneca


TEATRO DA BONECA

A menina tinha os cabelos louros.
A boneca também.
A menina tinha os olhos castanhos.
Os da boneca eram azuis.
A menina gostava loucamente da boneca
A boneca ninguém sabe se gostava da menina.
Mas a menina morreu.
A boneca ficou.
Agora já ninguém sabe se a menina gosta da boneca.

E a boneca não cabe em nenhuma gaveta.
A boneca abre as tampas de todas as malas.
A boneca é maior que a presença de todas as coisas.
A boneca está em toda a parte.
A boneca enche a casa toda.

É preciso esconder a boneca.
É preciso que a boneca desapareça para sempre.
É preciso matar, é preciso enterrar a boneca.

A boneca.

A boneca.


Carlos Queirós

segunda-feira, maio 1

Era uma vez num livro...


“Entrei numa livraria. Pus-me a contar os livros que há para ler e os anos que terei de vida. Não chegam! Não duro nem para metade da livraria! Deve haver certamente outras maneiras de uma pessoa se salvar, senão... estou perdido.”

Almada Negreiros, in A Invenção do Dia Claro, 1921